segunda-feira, 31 de maio de 2010

Passe Livre, mas na sua vez!

Devido às mobilizações contra o aumento das tarifas de ônibus ocorridas em Florianópolis, tivemos no auditório do CFH, no dia 19 de maio, o debate “Mobilidade Urbana e Processos Psicológicos: a universidade e o cotidiano da cidade”, com o intuito principal de discutir o papel do Psicólogo neste contexto.

Dentre os vários pontos abordados, faço aqui meus destaques, conclusões e provocações a todos presentes no debate e aos leitores deste blog - tomando a liberdade de utilizar, sem citações, algumas das falas apresentadas.

Questionou-se como se constitui o cidadão brasileiro nestas condições sociais de extremas dificuldades de acessibilidade a sua cidade, trabalho e lazer, devido um sistema de transporte caótico, caro e ineficiente.

Sem minimizar a importância do tema, já discutido na ocasião, chamo aqui a atenção a um outro aspecto sobre a construção deste cidadão: como se constituiu ou se constitui os sujeitos que criaram ou criam todas estas condições de desigualdades sociais?
A resposta talvez venha explicar o por que da repetição deste tipo de debate. O porquê de há anos estarmos nas mesmas picuinhas políticas, a mesma retórica de outros movimentos. Fato este apontado e lamentado pelo Prof. Botomé, que esteve presente neste debate e em outros momentos passados como este.

Onde está a evolução? Por que isso se repete?

Nossa história é testemunha de que muitos criticam as estruturas de poder até assumirem posições mais privilegiadas. É comum a utilização de movimentos ou manifestações apenas para projeções pessoais ou manobras políticas.

Mas por que as coisas acontecem assim?

Por que o ativista político de hoje, que luta pela igualdade e contra injustiças, vende-se quando assume algum poder?

Não há como negar que muitos dos poderosos de hoje foram grandes críticos de ontem. Sem dúvida os governantes e poderosos de amanhã estão hoje entre nós, lutando, criticando, apontando.
Por que a ilusão de que desta vez as coisas serão diferentes?

Por que estas pessoas quando finalmente têm o poder nas mãos esquencem seus discursos e agem em benefício próprio?

Parece-me simples: por que foram condicionadas à isso. Agem assim no seu dia-a-dia.

Querem exemplos?
Dentro de nossa universidade vemos estudantes desrespeitando a fila do RU, jogando lixo no chão, atirando bitucas de cigarro em qualquer lugar, ignorando o silêncio na biblioteca, fazendo apologia ao uso de alcóol e corroborando com o tráfico de drogas. As lampadas ficam acesas mesmo nos dias mais claros e ligamos o ar condicionado por nada. Ninguém se importa.

Não questiona-se as consequências destes atos por que não é legal, não dá popularidade, não é conveniente. A mudança de atitude dá muito trabalho e incomoda. Fechamos o olhar para o outro e visamos apenas o nosso próprio umbigo.

Desta forma, continuamos construindo cidadãos e políticos da mesma maneira de ontem. Não leva-se em conta seus comportamentos individuais ou seus princípios com o próximo. Apenas apoia-se seus discursos e macacagens.
Aplaudimos qualquer ato de rebeldia sem entendimento do processo todo.

Xingamos a reitoria, mergulhamos no laguinho e pulamos catracas, mas naturalizamos nossos privilégios e não refletimos sobre nossos atos se isso nos desagrada ou não nos é conveniente.
Nossos comportamentos e discursos são contraditórios.
Depois nos indignamos com as corrupções políticas e abusos de poder.

Enquanto não tivermos uma Revolução Cotidiana, na forma de agir individual, na maneira como vivemos, no comportamento de cada cidadão, dificilmente teremos a revolução que tanto idealizamos.

Acredito que aí está onde a Psicologia deve agir: na formação deste cidadão pensante que terá condições de atuar neste sistema. Um cidadão que tem o compromisso consigo mesmo de cumprir com seus deveres, a ter um olhar ao outro, e a estar alerta constantemente nas consequências de seus atos, sem que haja necessidade de vigilância para isso. Seres maduros.

Dentro de nosso contexto, devemos entender "cidadão" como "nós", estudantes universitários.

Proponho como uma forma de ação a conscientização dos alunos, dentro de nossa micro sociedade, a Universidade. Uma ação que crie uma onda de autopercepção, consciência e responsabilidade.

Se não for uma conscientização, que ao menos seja um condicionamento desta forma de se colocar no mundo.

Assim, quando um destes indivíduos chegar ao poder, ele talvez repita este mesmo comportamento de pensar no coletivo, nas consequências mais profundas de seus atos.

Não percamos nossas esperanças de fazer um mundo melhor. Mas para tal, comece fazendo alguns sacrifícios.

Sim, vc mesmo, no seu dia-a-dia!

PS: Segue a composição da mesa do debate: Allan Kenji (Coordenação), Renato Ramos Millis (Representante do CALPSI), Marcelo Pomar (Representante do Movimento Passe Livre), Prof. Dr. Silvio Paulo Botomé (UFSC), Profa. Dra. Daniela Ribeiro Schneider (UFSC), Profa. Dra. Andrea Vieira Zanela (UFSC), Profa. Msc Marcela Gomes Andrade (CESUSC).

Nenhum comentário:

Postar um comentário